MAS
HOMEM!
“É um assalto.
Fique quieto. Não olhe pra mim. Quero ver o saldo! Quanto é o saldo! O saldo,
cara! Logo! Vai! Depressa! A repetição: o saldo, cara! Logo! Vai! Depressa!”
Ante meu
nervosismo, revelado em três infrutíferas tentativas de achar no painel do
terminal o botão do saldo, o marginal, coladinho a mim, um trezoitão espetando
a minha costela, falou assim, deixando-me a parede e meia da morte:
“Tu quer levar
um tiro, é cara? Faz o seguinte. Bota saque! Saque! Quinhentos reais. Agora
cuidado! Se tu errar, eu te dou um tiro. Vamos! Depressa.”
Saque
efetuado, meu celular no bolso do bandido, vem a ordem final:
“Vou sair. Não sai daí. Não olhe
pra porta. Não se vire.
Se tu se virar, eu te derrubo com um tiro.”
Se tu se virar, eu te derrubo com um tiro.”
Isso aconteceu às 19h18 de 4/8/09, dentro da
agência do Banco do Brasil do Alecrim, Natal-RN. A vítima? Euzinho aqui, meus
nobres.
Sabem
por que estou lhes dizendo isso? Porque... Bom, pelo que acabo de ler agora, às
19h47, em O Jornal de Hoje, de hoje, de 6/2/12. Na
página 6, desdobrando uma manchete sobre a fuga dum centro de detenção, o
repórter dá o nome dos fugitivos e escreve: “Todos os quatro estavam presos na
unidade pelo crime de assalto a mão armada, o que deixa em alerta a polícia,
tendo em vista que a possibilidade de eles voltarem a praticar o mesmo tipo de
crime é alta”.
Bota
alta nisso! Ela é tão alta quanto se queira (alguém aí conhece o Siqueira?).
Meterem uma pistola no espinhaço dos indefesos é a mais verdadeira das
verdades, comentei com os meus botões, descendo da tipoia, tirando a camisa,
visto a onda calorenta que de mim começava a se desprender, pois a notícia
jogou-me na mente o calor do assalto de que fora vítima.
Jantei,
estirei os cambitos numa preguiçosa e tinha três opções de leitura. O jornal, a
Superinteressante e um livro, Sexo e Espiritualidade.
Achei de pegar
logo o Jornal e de dar uma olhadela no meio da estimulante reportagem.
Bisbilhoteiro, botei os olhos no início da matéria: “A fuga aconteceu por volta
das três horas, quando apenas um agente penitenciário e dois policiais
militares faziam a guarda de quase noventa homens”.
“Caramba!”,
exclamaram os meus amigos botões, tentando me abanar por causa do insuportável
ardor.
Continuei
lendo. Lá pras tantas, o jornalista se reporta assim ao secretário de Justiça e
Cidadania: “Ele lembrou que a governadora Rosalba Ciarlini determinou a
nomeação imediata de mais quatro agentes penitenciários, que serão enviados
para a penitenciária de Alcaçuz, de onde fugiram mais de 50 presos somente
neste mês de janeiro”.
“Calma aí,
homem! Veja a coisa pelo lado otimista. Quatro é melhor que dois. Já pensou se
tivessem sido nomeados apenas dois?”, meus parceiros disseram isso, sérios,
tornaram a me ventilar, mas juro que pressenti uma nesgazinha de ironia na
expressão dos safados.
Abandonei o
jornal e fiquei matutando (matuto adora matutar). Matutando, matutando, tive
uma belíssima ideia, modéstia à parte. E se os presos ficassem presos? Já
teríamos um estrondoso avanço na segurança pública, não acham, minhas nobres?
Matutando,
matutando, lembrei-me de Chico Cabeludo, colega de copo. Diz ele: “Tem que
aumentar o risco pro bandido, Bastião. Os caras não tão nem aí pra polícia. Tão
assaltando de cara limpa, num querem nem saber de câmara, metem bala e saem
chupando o dedo. Só tem um jeito, Bastião, mas se a gente der esse jeito os
‘direitozumano’ cai de pau em cima da gente”.
Qual, Chico?
Matar?
“Não. Que é
isso, Bastião!”
Prender e
botar os meliantes pra arrancar toco?
“Não!”
Então qual é o
jeito, Chico Cabeludo?
“É o jeito, né,
Bastião!”
Espichei mais
as pernas e tome matutação, mormaço e balançada de rede por contas dos
solidários botões. Matutando, matutando, saí da Segurança, passei na Educação,
parei na Saúde. Como costuma dizer o Chico, estamos pebados. Nenhum sistema desses
funciona. Pagamos impostos federais, estaduais, municipais, escambais e nadica
de nada de retorno. Precisamos fazer alguma coisa. O quê? Sei lá! Mas vocês
sabem, não sabem, meus nobres?
Onde os desalmados governante enfurnam tanta mufufa, se a
Educação é completamente analfabeta, dizendo-se “menas” favorecida, e anda
gritando epa? Escola até que existe, mas o nível de ensino, ó! Será que os
carinhas desconhecem que tudo começa com a educação?
Acordem, governantes! Mexam-se, mexam-se!
Onde os desalmados governantes enfurnam tanto dinheiro, se a
Segurança é completamente vulnerável, dizendo-se desprotegida, e caminha com as
mãos pra cima? Policiais até que existem, mas o nível de organização, ó! Será
que os carinhas desconhecem que o combate ao crime começa quando se aumenta o
risco para o infrator?
Acordem, governantes! Mexam-se, mexam-se!
Onde os desalmados governantes enfurnam tanta grana, se a
Saúde é completamente esquelética, dizendo-se mortiça, e perambula aos tombos?
Hospitais públicos insuficientes, daí o nível de atendimento, ó! Será que os
carinhas desconhecem que tudo termina quando a saúde vai para o brejo?
Acordem, governantes! Mexam-se, mexam-se!
Ajudado pelos botões, levanto-me da rede e apanho o jornal,
os olhos em cima de uma notícia de ladroagem. Isso é fichinha, matutei. Ladrão
é o que não falta neste país. Dou uma senhora espreguiçada, imaginando ir ao
computador a fim de pagar a fatura do Híper. Mas não dava mais tempo. Pago
amanhã, o juro não deve ser essa coisa toda, pensei, olhando a percentual. Como
assim? 16,96% ao mês, 572,93% ao ano?
Foi isso, Senhor. Esse é o relatório.
Muito bem. Aí o senhor viu a taxa de juros, seus botões o
abanaram, mas aí o senhor não aguentou a pressão e veio me visitar. Lembra de
mais alguma coisa, Seu Bastos?
Da troca de pneus, Senhor. Antes de chegar ao hospital, o
carro caiu duas vezes nuns buraquinhos, por isso, o motorista teve de trocar
duas vezes o pneu. Lembro também, Senhor, dos gemidos de meus companheiros,
que, assim como eu, ficaram acomodados, por quase cinco horas, no corredor do
hospital.
Muito bem.
Então, Seu Bastos, o senhor acha que morreu de indignação?
Sim! O
Senhor também não acha?
Acho, não.
Tenho certeza. Por isso o senhor vai voltar pro meio de seu povinho. Só os covardes,
coisa que o senhor não é, Seu Bastos, morrem de indignação. Vai! Vaza! Pegue o
beco!
Mas, homem!
Pelo amor de... do Senhor, não faça isso não, homem de Deus, digo do Senhor.
Deixe-me aqui.
Não, Seu
Bastos. Seu lugar é lá. Volte!
Vote? O
Senhor disse votar, foi?
Disse
volte, Seu Bastos. Votar é problema do senhor, de seu livre-arbrítio, entendeu?
Mas Homem!
Um abraço
desassombrado,
Tião
2 comentários:
Muito boa a postagem...RSRSRSRSR
Valeu, anônimo! Anônimo de onde?
Um abraço,
Tião
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