A FESTA DE CERTA TURMA
Olá, gente,
Escrevo (ou
seria redijo?) a fim de matar o tempo. Hábito besta, coisa de maluco, diria. E
não alimento a história do escrever apenas por prazer. Espero ser lido,
confesso numa boa. Minhas postagens são lidas, em média, por treze leitores.
Três delas, porém, deixaram-me desanimados. Apenas quatro leituras, pode? As
três estão contextualizadas com o seguinte título: A Fifi, o Pedro e Factoides.
Estão, não, estavam, pois acabei de excluí-las. Juntei-as num único texto e as
deletei. Ficou um mostrengo de sete páginas. Oscila entre conto grande e
romance pequeno. O bicho tem quatro tópicos: A fogosa Fifi no barzinho, A
feiosa Fifi na faculdade, O prisiaca do Pedro pinta no pedaço e... Não convém
revelar o quarto, leitora.
Vejam a
loucura. Se os textos independentes, coisa de página e meia cada um, não foram
lidos, imagine um tijolão de sete laudas. Mas, enfim... Bom, darei um pote de
doce de leite a quem chegar ao fim do danado.
É isso!
A FOGOSA FIFI NO BARZINHO
Oi, Bonitão. É a Fifi. O Feitosa te
ligou?
Fifi, menina, desculpe aí. Não. O
Feitosa não ligou não, Fifi. Escute...
Nisso o papo ficou viúvo: a bateria
de meu celular acabava de morrer.
Eu havia me encontrado com a Fifi,
num barzinho, há coisa de duas horas. Estava bordejando, digamos assim. E ela
também, pelo visto. A tevê do MPbar mostrava um jogo de futebol. O barulho dos
assistentes me deu a dica: escreva sobre a paixão futebolística, cara.
Nisso, e já meio chumbado, encontrei
a coroa bonitona, também biritada. Ou melhor, a bonitona me encontrou quando
saía do setor interno do bar. Riu, abraçou-me forte, perguntou
pela turma e quis saber se eu soubera da última do Feitosa. Feitosa não tem
jeito não, meu amigo, disse ela.
Ficamos de papo uns dez minutos. Mas
só a charmosona tagarelava. Minha fala se resumia a “Não é isso! Oh! E então! Caramba”!
Parafraseava e bulia na memória. Quem é, meu Deus? Turma? Que turma? Seria a turma
da faculdade? Feitosa? Não me lembro de ter me enturmado com nenhum Feitosa. Ela
deve estar me confundindo com algum ex. Mas por que não me trata pelo nome do
ex? Talvez não, por estar em dúvida se sou realmente o ex. Ela está bebendo. O álcool
deixou-a de recordação zanolha. É isso. É coisa dos birinaites. Mas a voz não
me é estranha. Ah, o tempo.
Estimei-a nos arredores de quarenta
anos
, pensei em abrir o jogo da franqueza, mas o acanhamento disse não. Passados
uns minutinhos, trocávamos números quando parou um carrão a uns dez metros da
gente. A lindona me deu um abraço apertadíssimo, afogueados alisadinhos de
volúpia, e se mandou para o carrão. Achei até que não escutara o matuto e
medroso “Já vai”?
Mas havia escutado, sim. Ouviu, não
se segurou e caiu na risada. Falou misturando riso com glamour:
Tás me conhecendo não, Tião? Sou a
Fifi, homem de Deus?
A danada revelou-se e se mandou pro
carro, na maior risadeira.
Fifi! Não acredito! A Fifi está linda
demais. Como ficou gostosa! Que é isso!
Aturdido com a situação, fui pra casa
disposto a escrever sobre a paixão pelo futebol. Mas de miolos embebidos e com
a coroa da linda Fifi na cabeça, terminei arengando com o word e adeus crônica.
Arengava com o word e com o irritante sonsinho de ocupado do celular da Fifi,
pois queria falar um “desculpe aí, minha amiga”.
A arenga só acabou quando a Fifi me ligou
e a voz de risada anunciou:
Oi, Bonitão. É a Fifi. O Feitosa te
ligou?
Fifi, menina, desculpe aí. Não. O
Feitosa não ligou não, Fifi. Escute...
Então, como narrei, o papo ficou
viúvo por causa da morte da bateria do celular.
Passei a ligar de outro aparelho, mas
ela não atendia. Nunca atendeu, essa é que é a verdade. A voz chatinha diz que o
celular está desligado ou fora de área.
Fifi foi colega de faculdade. Apresentava
grandeza 100 de feiura e menos 100 de charme (há feias charmosas, sim). Agora,
a escala é 100 de beleza e mais 100 de charme. Mas eu estava desconfioso com
esses adjetivos.
Explico: estávamos bêbados. Provavelmente
ampliamos os atributos lascivos do colega. O álcool é bom nisso, gente. Fifi
pode ter me transformado no homem mais saboroso do mundo. Eu, já disse, achei-a
lindíssima e pra lá de gostosa. Na minha visão, seus olhos soltavam estrelas e
os mamilos esmurravam a blusa. Ela também deve ter percebido meus olhos
faiscando. É lógico que não percebeu nada nos mamilos, pois os meus são meios
insensíveis para essas coisas. Falar
nisso, alguém pode me dizer pra que serve mamilo de homem?
Ontem, na rede, desparafusava a
crônica adiada, a da paixão do torcedor, mas precisei ir ao supermercado.
Estava zanzando entre as gôndolas e aí adivinhem quem vejo? Pois não foi!
Fifi, de vestidão creme, estava
comprando chocolate. Será mesmo a Fifi, matutava, olhando-a de esguelha. O
tempão sem vê-la e a carraspana do barzinho aconselhavam-me prudência. Se for mesmo
a Fifi, é muito mais mulher do que os eróticos uísques avaliaram, pensava.
Terá ela me visto? Fiquei ruminando e
cheguei à conclusão que não era a Fifi. Mulher não só vê como pressente. O fato
de ela estar olhando os chocolates não a impediria de ver alguém querendo
paquerá-la, mesmo a metros de distância. Mas, por via das dúvidas, recorreria
ao truque do celular. Fingiria que estava falando com alguém, passaria pertinho
dela e, pelo rabo do olho, observar-lhe-ia a reação.
E assim fiz. Fifi não me deu bola, conquanto
tenha passado a impressão de que endurecera as feições, reprovando,
provavelmente, o misterioso sorriso que eu deveria estar exibindo.
Fui pra casa remoendo o encontro.
Cheguei e dei uma espiadinha nos e-mail. Estava lá:
Que homem mais importante! Quase me
derruba no supermercado, mas nem sequer um olá me dirige. Que mal te fiz para
me ignorar assim, Bonitão?
Sim, o Feitosa te ligou?
A FEIOSA
FIFI NA FACULDADE
Foi comigo
com quem Firmina se identificou primeiro. Sentiu-se atraída, digamos assim. A nossa
feiura levou à recíproca simpatia e provou o viés carnal da Lei da Atração.
A
propósito de nossa fealdade, não posso deixar de citar o colega Pedro Avelino,
o Bigode. Pedro, gente, era o gozador-mor da turma. Botava apelido em todo o
mundo. Botou-me logo o apelido de Bonitão. Mas se conteve e chamava Firmina de
Nininha.
Ninguém
se sentia ofendido com as brincadeiras do cara. Sabíamos que tudo era da boca
pra fora. Bons tempos, bons tempos.
Certa noite,
numa bebedeira, Zé Lima, o Birita, ajudante das sacanagens de Pedro, levanta a
bola para o gozador.
E aí
Pedro, podes dar um exemplo do que é esperança e variância? Variância de X igual
a esperança de X ao quadrado menos o quadrado da esperança de X quer dizer
exatamente o que, meu caro Bigode?
Lá vem
fuleiragem, pensamos. Pedro coçou o bigode e falou de cara fechada: Vejamos,
meu caro Birita. Chamemos de xiszinho a anatômica, adormecida e esquelética
variância da Fifi, e de Xiszão a esperança do Bonitão aí, que é, ao mesmo
tempo, a esperança da Fifi. As duas esperanças, ao quadrado, portanto, caminham
ouriçadas na esperança de encontrarem o alívio padrão nas medianas do parceiro.
Vou
contar só mais uma de Pedro, gente. Aula de português, o professor Anecildo
falava da diferença entre precisão e concisão. Expressava-se mais ou menos
assim:
Precisão
é não incorrer em falta. Concisão é não ter em excesso. Um corpo contextual
desprovido de banha, mas que não oculte os detalhes essenciais, ainda que nas
entrelinhas, e que provoque prazer no leitor. Quando virem algo assim, podem
apostar que estão diante da precisão e da concisão.
Mal o
mestre termina a explicação, Pedro fica em pé, vira-se para a Amanda e grita.
Gritou mesmo, gente:
É você,
Amanda. O senhor, professor, está se referindo à Amanda.
Amanda,
pessoal, era linda. Certamente, a colega mais mais da turma. Ficamos antevendo a
lorota. Perguntamos, a risada já rindo:
Por que a
Amanda, Bigode?
Ora, ora!
Um corpo desprovido de banha, essencialíssimos detalhes à mostra, exceto os das saborosas entrelinhas, e que provoca prazer. Quem tem esse corpo afora a Amanda?
Como
estava dizendo, foi comigo com quem Firmina primeira se identificou. Terceira
aula, intervalo de fundamentos de economia:
Oi!
Oi! Tá
gostando do curso, Firmina?
Tá cedo pra saber, Tião. Mas esse negócio de
demanda me parece confuso. Por que não chamar logo de procura? Agora, já
percebi uma coisa em relação à turma. As meninas são muito cu doce, Tião. E os
meninos, bestas que só eles.
Oito
meses adiante:
Quero te
falar uma coisa, Tião.
Fale, minha
flor.
É... É...
É...
É...?
Firmina é
assim, cheia de dúvidas. A reticente conversa ocorria no calçadão da sala onde
dali a minutos faríamos a primeira prova de estatística I. Firmina repetiu a imprecisão:
Bom,
quero te falar uma coisa, Tião.
Quer me
falar uma coisa? Isso você já falou, Firmina. Que coisa é essa, minha flor?
Oh, Tião!
Que homem chato! Faz duas noites que não durmo, indecisa sobre certo assunto.
Acabei me decidindo hoje pela manhã. Vou me suicidar, Tião. Meu sonho é entrar
no mar e ser comida pelos tubarões. Mas desejo lhe dar uma coisa antes. O que você
acha?
Uma boa!
Não é esse o seu sonho? Que seja feita a vossa vontade, respondi.
Não falávamos
brincando. Via pelo olhar da Firmina o capeta batendo palmas. A determinação
suicida era flagrante. Imaginei, então, que a única forma de tornar útil a
conversa seria concordar com a amiga. Em certas circunstâncias, a melhor forma
de discordar de alguém é a contraditória concordância, pois o choque mental
deixa o alguém desnorteado. No caso da Firmina, a esperada ladainha do
não-faça-isso e o sentimentalismo extremo não resolveriam a questão. Quando
muito, adiaria. Fiz proposital paradinha e repeti:
Uma boa,
Firmina. Dê-me logo essa coisa. Quem sou eu para contrariá-la, minha amiga.
Oh, Tião.
Grande amigo você é, hein! Esperava... Você acha mesmo...
Acho, sim. E
acho porque já passei por isso, Firmina. Só não me suicidei graças ao egoísmo. Tinha
um bocado de gente que me amava, e o egocêntrico aqui arquitetando a própria
morte a fim de neles construir o sofrimento. Pensei nessa bobagem e desisti,
Firmina. Você tem o jeitão de reservada, mas não dá mostra alguma de ser egoísta.
Sua timidez chega a mim como particularíssimo charme, pode acreditar, Firmina.
Porém, como diz o ditado, quem vê cara não vê coração. Você retribui a nossa presença
com ausência, mas beleza! Valeu, Firmina.
Estava
exagerando no quesito charme. Contudo, a boa causa justificava a encenação.
Continuei exagerando:
Temos oito
meses de convivência, mas no segundo mês já estava embevecido por você. Amo
você, Firmina. Por isso vou entender a fatal ação. Eu, sua família, colegas,
todos, enfim, haverão de compreender o egoísmo, a ingratidão, a soberba, o
desdém, a empáfia, o pedantismo, a indiferença...
Chega, Tião. Para pelo amor de Meu Deus! Escute. Foi
você a primeira pessoa a dizer que me ama. Nem meus pais falam isso. Sou feia. Ando
deprimida, cara. Nunca um homem olhou pra minha magra bunda, nem um simples
fiufiu eles me dão. Dezenove anos e ainda sou virgem, Tião.
São belos
motivos para nos deixar pra sempre, não é, Firmina? Sem querer plagiar o seu
discurso, mas também sou feio, nunca uma mulher olhou pra minha magra bunda,
fiufiu também elas não me dão. Vinte e dois anos e ainda sou virgem, Firmina.
Mentira!
Credito não, Tião. Tu, virgem! Credito não!
Pois pode acreditar, D. Fiufiu. De onde tirou
essa expressão, Firmina? Pense num nome bonito! De hoje em diante, vou chamá-la
de Fiufiu, viu? Não, Fiufiu fica compridão. Vou chamá-la de Fifi, certo?
Já estava
percebendo certas mudanças nas atitudes da Firmina. O olhar, por exemplo, mostrou-se
afável tão logo eu disse que a amava. E caíra na risada em virtude do codinome
Fifi.
Vamos pra sala, Tião, o professor já chegou.
Terminada
a prova, perguntei:
Por certo
não mais receberei o presente. Mas... O que era que você ia me dar mesmo, Fifi?
Ia, não.
Vou dar, Tião. Espero que aquela história fique entre nós, tá? Quero dar a você,
Tião. Principalmente agora, pelo que há pouco revelasse. Quero que seja meu
autor, assim como serei a sua autora. Quando quiser...
Firmina matara
a ideia de antecipar a própria morte. Passou a se cuidar, a falar com os
colegas, a querer bem a vida. Verdade é que Firmina, agora chamada de Fifi, era
mais mal-ajeitada do que feia. Contudo, depois da nossa conversa, tornou-se
amorosa e comunicativa. Talvez por isso o pai tenha lhe dado um fusquinha.
E foi naquele fusquinha que recebi o presente. Numa
praia, noite de lua cheia, eu e ela imitando os gemidos do mar.
Os dias se sucedem, e a Fifi arruma um namorado, ao
sentir que o nosso aconchego não era paixão. O curso chega ao fim, a turma cola
grau e cada colega toma seu rumo. A rotina começa por deixar escassas as
conversas e acaba matando a cumplicidade de cinco anos de convivência.
É verdade, caro leitor. Somos vulneráveis ao tempo.
Formamos um grupo, compartilhamos frustrações, unificamos vitórias, construímos
insuspeitos ajutórios. Cumprido o objetivo, trocamos e-mail, gravamos números e
nos despedimos com promessas de contínua comunicação. Aí vem o dia a dia e
destroça tudo, a ponto de esquecermos o rosto e até o nome daquele colega. Ou
nunca lhe ocorreu algo semelhante, leitor? Não se iluda: a amizade precisa de
laços fortemente atados, de permanente vigília, a fim de que o tempo não os
desprenda com leves sopradas.
Não
imaginava o “algo semelhante” ocorrendo comigo. Pior. Justamente com a Fifi. Certo
que estava fazendo vinte e cinco anos de nossa colação de grau, mas mesmo
assim. Se não bastasse o acoite de ter sido indiferente a ela, a Fifi chega e
põe no enredo o tal de Feitosa. Não tenho a menor ideia de quem seja o cara.
Preciso
bolar um jeito de encontrar a Fifi. Deitei-me e comecei a pensar numa saída.
Cochilava quando a campainha tocou. A visita ia entrar com a saída.
O PRISIACA DO PEDRO PINTA NO PEDAÇO
Boa tarde. Sou a detetive Isabela. Preciso falar com o Sr. Tião.
Detetive?
Nossa! O que fiz, meu Deus! Visualizei o sistema de câmaras, destravei o portão
e mandei-a entrar. Repetido o cumprimento, a detetive se explicou.
O Sr.
Pedro Avelino estava organizando uma festa para comemorar os vinte e cinco anos
de formado em Economia. Queria reunir a turma, mas não estava conseguindo o
endereço do pessoal. Localizara apenas cinco colegas. Então ele a contratara a
fim de localizar o restante.
Acabada a
apresentação, a detetive me deu um bilhetinho de Pedro, a ele anexado um cartão
de visita.
O senhor pode
me dar seus dados para eu discriminá-los no relatório?
Alegre,
dei-lhe as informações. Formalizávamos a despedida, o estalo chegou:
A senhora
já localizou, a Fifi, por acaso? Firmina Bezerra da Silva é o nome dela.
Deixe-me
ver, disse ela, pegando a listagem dos procurados. Essa Firmina... me parece
que já... Pronto. A Firmina já morreu, Sr. Tião.
Quê?!
Fifi morreu? Não pode. Se não faz...
Desculpe.
Sinto muito. Essa informação é do Sr. Pedro. Veja. Ele localizou o Sr. Vaz,
Marcílio, Reginaldo, a Sra. Ivaneide e a Sra. Amélia. E informou como mortos o
Sr. Bruno Itamar, a Sra. Zulmira e a Sra. Firmina.
A
detetive foi embora, eu fiquei arrasado. Fifi morta! Há uma semana, ela... O
celular dela devia estar jogado em algum lugar, por isso que ninguém atendia.
Itamar eu sabia que tinha morrido, mas a Zuzu e a... Peguei o cartão de Pedro,
localizei o celular e liguei.
Entusiasmados
cumprimentos, entrei logo no assunto Fifi. Com voz de choro, contei-lhe tudo,
tim-tim por tim-tim. Pedro ouvia calado. Por fim, também amargurado, comentou:
Bonitão,
meu amigo, você deve estar com problemas. Está me contando algo muito esquisito.
A Fifi, Bonitão, suicidou-se vai fazer um ano. Morávamos juntos havia seis
anos, cara.
Jura!
Morávamos,
bonitão. Escute. Estou morando aqui, em Recife, mas costumo ir a Natal visitar
meus netos. Terça feira estarei aí. Almoçaremos juntos, tá certo? Ligo assim
que chegar.
E assim
foi. Encontramo-nos no restaurante Cristal. Passada a euforia do reencontro, no
segundo uísque o papo fica girando entre a festa da turma e o suicídio da Fifi.
Veja como
são as coisas, Bonitão. Há seis anos, reencontrei a Fifi aqui mesmo neste
restaurante, daí eu tê-lo sugerido como local de nosso encontro. Trocamos celulares,
foi pintando um clima e dali a dois meses estávamos de volta, por coincidência
nesta mesa. Fifi ficou um mulherão, rapaz. Queria que você visse...
Eu vi, Bigode.
Mulheraço, realmente.
Ô homem
teimoso da bexiga! Fifi suicidou-se, cara. Entrou no mar e não voltou. Leia
isto, falou, passando-me um bilhete:
“Amado
Pedro, bom-dia. O mar me seduz, querido. Vou para os braços dele, realizar o
sonho de ser comida pelos tubarões”.
De sua
Fifi.
Estávamos
em nossa casa de praia, em Pirangi. Acordo às cinco horas da manhã e vejo esse
bilhetinho, Bonitão. Bom, ia lhe mostrar isto depois, mas veja aqui, ó, ó! Foi
esta a mulher que você viu, foi?
Pedro pegou
o celular e começou a passar fotos da Fifi: ela e ele se beijando, os dois num
aniversário, tomando café, fotos de todo jeito, enfim. Por último, sem dizer
uma palavra, Pedro mostra a Fifi num caixão de defunto. Ficamos um tempão em
silêncio.
Meu Deus!
Estou muito confuso, Bigode. Quem era aquela gostosona, então? Por que diabos
ela se despediu dizendo-se Fifi?
Não tenho
ideia, Bonitão. Só sei que precisa de ajuda. Tem mais o detalhe do Feitosa,
Bonitão...
Fifi
costumava beber em barzinho, Bigode?
Bebia
apenas comigo. Bebíamos de virar a perna. Depois íamos virar pernas. Olha só. Nem
queria tocar neste assunto, mas vou falar. Fifi era viúva, sabia? E sabe o nome
do finado? Chamava-se Feitosa. Ele também se suicidou, Bonitão.
Ave,
Maria, comentei, todo arrepiado, morto de medo. Sabe, Bigode, no começo do
curso, Fifi esteve a ponto...
De
suicidar-se. Não se matou graças a você. Ela me contou, Bonitão.
Quer um
conselho? Se voz masculina ligar pra você, pergunte logo o nome. Caso respondam
Feitosa, desligue imediatamente. Sabe-se lá se não é o Feitosa querendo
convidá-lo...
Vira essa
boca pra lá, Bigode.
Brincadeira
à parte, Bonitão, sabe o que acho? Alguma aluna de nossa época, duma sala
vizinha, por exemplo, esteve a fim de você. Mas você tinha um caso com a Fifi.
Ela não esqueceu. Daí, bêbada, passa-se pela Fifi e inventa o Feitosa. Zoação
das boas, Bonitão. Esquente com isso não, bicho.
Vinte e
cinco anos depois, Bigode? Tá maluco? Bom, e você vai fazer a festa justo na
praia onde a Fifi se matou?
É o melhor local. Ficaremos à
vontade lá. Toda a organização ficará por conta de uma firma de eventos. Faltam
dois meses. Devemos nos encontrar várias vezes durante esse tempo. Será uma
confraternização histórica, Bonitão.
E foi. A festa se deu de sábado para
domingo.
Por exigência de Pedro, chego ao
meio dia do sábado na imponente mansão, na beira mar de Pirangi. Pedro quer a
minha opinião acerca de certa prova organizada por ele (só fuleiragem, Bonitão,
disse-me, rindo), já que modificara as perguntas umas duzentas vezes. Mentira
de Pedro. Ele não queria era ficar bebendo sozinho, daí ter falado assim: desisti
de mostrar a prova, Bonitão. Perderia o encanto do negócio.
Bem, Nazaré,
a moça da firma organizadora, nos chama para o salão onde será aplicada a prova.
Pretende explicar os procedimentos. Quadro-negro, giz, caderneta de chamada,
tudo prontinho. Os assentos são carteiras oficiais, dessas de colégio. Na sala
contígua, poltronas estão à disposição da família dos “alunos”.
Arriei a
queixada com a organização do evento. Pedro deve ter muita grana. Estourar esse
dinheirão todo só para fazer uma resenha com a turma! Ele quer rever o pessoal,
por certo, mas o carro-chefe da confraternização é o espírito gozador. E o
clímax, a justificativa de tamanha despesa, ocorrerá na prova a ser aplicada
por mim. É aqui que o “aprontador” do Pedro vai se realizar. As perguntas devem
ser bem sacanas.
Tenho que lhe dar os parabéns, meu
caro. Pensou em tudo, hein? Vejo ali uma salinha com a placa Enfermaria.
Isso mesmo, Bonitão. Sabe-se lá se o
exagero não fará algum torodon passar mal? E se o neto de alguém adoecer? O
plantonista será o Dr. Berilo, morador aqui ao lado, meu amigo. Mas ele já
vinha beber e comer de graça, entendeu? Era craque de futebol. Hoje eu vivo
dando banho de cuia nele. É, amigo Bonitão, tudo vale a pena quando a alma não
é pequena. Falar em alma, o Feitosa te ligou?
Homem! Exclamei e me benzi,
porquanto a lembrança de que o Feitosa era defunto deixava-me nervoso. Ou
melhor, queria que Pedro assim imaginasse.
Roteiro
na mão, Nazaré explica:
Teremos noventa
minutos de aula/prova. O professor será o senhor, Sr. Tião. Quando chamar o
nome do aluno, o senhor pede que ele se levante, exceto os defuntos, e faça uma
saudação aos colegas. A exceção fez a Nazaré ficar ruborizada, mas tiramos de
letra a gafe. Desculpem, como sabem são três os colegas que nos deixaram. O Sr.
Bruno Itamar, a Sra. Zulmira, a Zuzu, e a Sra. Firmina, a Fifi. Não esqueça, Sr.
Tião, de imitar o professor de Elementos de Estatística, o Perigoso: os alunos
deverão ser chamados de Torodon e as mulheres de Bacorinhas, acompanhados dos
apelidos, se for o caso.
Continuou
a Nazaré:
Precisa
avisar aos alunos, Sr. Tião, que, quando for chamado um falecido, todos devem ficam
de pé por dois minutos para o um minuto de silêncio. Dois, desculpe. Mas não se
preocupe em dizer que o fulano morreu. Logo na chegada, os alunos receberão um
fôlder com o nome de cada um, uma foto recente à esquerda do nome, e à direita
a cidade onde reside. No caso dos mortos, a foto é uma cruz e a cidade é
cemitério. Daí que, na aula, todos já terão conhecimento de tudo. A menos que
não tenham lido, é lógico.
A
propósito, Sr. Pedro, convém lhe dar uma dica, se me permite. Na fala de
abertura, evite citar o nome de sua esposa, D. Fifi. Até porque, há sempre o
risco de alguém perguntar de que ela morreu. E, convenhamos, suicídio é uma
palavra forte.
É isso. São
quatro horas. Daqui a pouco o pessoal começa a chegar. Ah, tomem o fôlder de vocês.
Muito obrigada.
Acho bom
a gente tomar uma, Bonitão.
Concordo.
Essa moça trabalha bem, Bigode.
É. É, mas
não vou seguir o conselho dela não, cara. A Fifi vivia falando em fazer a festa
dos vinte e cinco da gente. Como não falar tal coisa pra turma? Vou falar, sim.
Ficamos
bebendo e analisando o fôlder. Logo o médico da confraternização juntou-se a
nós a fim de acertar alguns detalhes com o amigo anfitrião. Bigode saiu para
falar com Nazaré, o que nos ensejou galhofar do amigo em comum. Passamos um
tempão recordando as histórias dele. O
médico, Dr. Berilo, fora jogador de futebol, atividade em que a gozação é corriqueira.
A veia brincalhona do doutor ainda pulsava forte. Só deixamos de recordar as
sacanagens quando o azoreta se aproximou de nós. Vinha alisando o bigode,
prenúncio de que estava armando algo.
Cinco horas
da tarde e grande parte da turma já havia chegado. O pessoal de apoio acomodava
famílias e os “alunos” acomodavam uísque. O clima de festa era visível.
Às oito
horas começa a primeira solenidade: dois religiosos – um padre e um evangélico
– falam sobre o poder da amizade.
Terminadas
as palestras, Nazaré anunciou a fala de Pedro. A sala de familiares em silêncio
fazia contraponto à barulhenta dos alunos, quatro deles puxando fogo.
Palavras de agradecimentos, Pedro não deu
bolas para a opinião de Nazaré e uma voz sofrida revelou a intenção de a Fifi
realizar aquela festa. Nesse ponto, a voz alegre do Zé Lima, o Birita,
interrompeu o pesar:
Mas a
Fifi foi em paz, colegas. Parecia sorrir, estava linda naquele caixão dourado.
Ri da
mentira do peste. A pessoa que morre afogada fica deformada. Como a Fifi estaria
linda e sorrindo? Bichinho mentiroso, pensei, sorrindo. Tive a impressão de que
Bigode estava copiando o meu sorrisinho.
Pedro
ligou a grandeza da comemoração à vontade da Fifi com o repeteco de Fernando
Pessoa: “Tudo vale a pena quando a alma não é pequena”.
Findos os
aplausos, Nazaré noticiou a minha participação, a aula/prova.
Dei
sonoro boa-noite e sapequei Shakespeare pra cima da turma. Pedro não havia se
amostrado com Fernando Pessoa? Por que eu não podia me amostrar com
Shakespeare?
Boa
noite, colegas: “Atiramos o passado ao abismo, mas não nos inclinamos para
ver se está bem morto”. Estamos aqui para...
Falei que
falei sobre os complementos do “para”.
Parei por causa dos acenos do Bigode. Pedia que eu parasse logo com a
saudação. Era evidente a ansiedade dele. Parecia que ia infartar. Temperei a
garganta e prossegui.
Desconheço
o assunto da aula. Só sei que a prova correspondente está neste envelope. Vou
fazer a chamada, colegas. Peço-lhes que façam um minuto de silêncio quando eu
falar o nome de um colega morto. Abri a caderneta:
Torodon
Antônio Vaz, o cardeal.
Presente,
ilustre mestre. Forte abraço, colegas.
Bacorinha Amanda Amada.
Presente, Bonitão. É um enorme prazer
participar desta festa. Abraços a todos.
Torodon Bruno Itamar.
O pesar foi duradouro. Passei cinco
minutos fingindo extrema atenção na caderneta. Ia nos seis quando tive pena e acenei
o assento.
Torodon Carlos Félix, o Keynes.
Presente, professor. Um abração,
pessoal.
Bacorinha Firmina Bezerra, a Fifi
Impossível narrar com precisão os
acontecimentos a partir daquele instante. Garanto fidelidade à ventania sobre a
mesinha do professor, a ponto de derrubar a caderneta, escoltada de tétrico silvo,
que me tornou arrepiado, e abraçada ao sombrio e longo “Presente, Bonitão”
falado pelo teto do ambiente.
A cena da
mulher atravessando a parede do fundo da sala também avalizo. Toda de branco,
pingando água, rosto encerado, descalça, mãos estendidas. Assim ela saiu da
parede. Perdi-a de vista quando chegou ao meio da sala. Morri ali, gente. O
padre, Birita e a esposa também apagaram, disseram-me depois.
Impossível
narrar os acontecimentos seguintes. Deixo com a sua imaginação, leitor, as
cenas de correria, gritaria, histeria. E os pedidos de calma do Pedro e da
Fifi, agora preocupadíssimos em razão da proporção da brincadeira.
O “morri
ali, gente,” não é metafórico. Morri mesmo. Por conveniência literária, explicarei
adiante.
O padre,
Birita e a esposa apagaram, mas logo estavam recuperados. Meu caso, esse sim,
tornou-se grave. Dr. Berilo não conseguia me reanimar. Desfibrilador, o jeitão
preocupado e a ordem para que o pessoal se afastasse lotaram de expectativa a
sala.
Precisamos
de uma UTI móvel. Dê-me seu celular, Bigode. Rápido, homem! Ele tem que chegar logo ao hospital.
Daqui que
chegue, Berilo. Helicóptero. Alguém deve ter um aqui na praia. Meu Deus do céu,
Fifi. Que merda a gente fez, Fifi. Fifi não falava, apenas chorava. Pedro
apenas choramingava. Mas não só ele. Afastem-se. Alguém me ajude a levá-lo pra
minha sala. Farei um procedimento radical. Levaram-me.
Berilo,
pelo amor de Deus. Ele...
Agora é
tarde, Pedro. Os próximos cinco minutos serão decisivos. Rezem, pediu o Dr.
Berilo, fechando o improvisado ambulatório.
Começamos a rir. Bigode está se borrando,
Tião. Daqui a dez minutos você morre, está certo? Vou dar a sugestão de deixá-lo
num sofá, no centro da sala de aula, ok? Direi ao Bigode que o protocolo médico
exige algumas perguntas para fins da autópsia e que a polícia deve nos intimar
a fim esclarecer certos pontos. Fecharei a conversa assim: Desculpe, amigo
Bigode, mas você está encrencado.
Cuidado,
Tião, para não exibir sinais de vida. Bigode e Fifi devem ficar na sua
cabeceira. Mas, assim que o Bigode lhe der as costas, você dá um grito e pula
no cachaço dele.
Não sei
se vou aguentar ouvir os dois chorando sem dar uma boa gargalhada, Dr. Berilo.
Mas vamos lá. Pode me matar.
Dr. Berilo
saiu e dali a instantes estavam me pondo no sofá. Redundante dizer que eu só
ouvia. Choro e lamento, é claro. Fifi beijou-me no rosto e sentou-se pertinho
de mim. Bigode imitou o ritual da Fifi. Não saiam nem a pau. Passados uns cinco
minutos, o Dr. Berilo falou:
Vou dar
um calmante a vocês dois. Venham aqui.
Ufa! O
choramingado foi se afastando e eu:
Rahahá!
Gritei e pimba no cangote deles.
Mais
cenas indescritíveis, leitor. Mas
imagine os olhos aboticados do presepeiro casal. Não apenas do casal, é evidente. Bom, a bacorinha Ivaneide sentou a Fifi e deu-lhe um copo d’água. As bacorinhas Amélia, Alzira e Socorro choravam rindo e riam chorando. Os torodons gritavam e assobiavam. Bigode coçou os olhos, o semblante começou a
se transformar, as bochechas se dilataram, a gargalhada invadiu o ambiente. Agora todo o mundo, ria, gente. Dr. Berilo precisou segurar a pança.
Vou matar
esses dois filhos da puta, Fifi. O Berilo eu vou castrar. E o Bonitão vai ficar
de rosto mais bonito.
Antes
mude a calça, Bigode. Tás todo mijado, homem de Deus, zombou o Dr. Berilo.
Aproveite
e tome banho, Bigode. Catinga mais infeliz!
FACTOIDES DOS FALSOS FALECIMENTOS
A resenha
comia solta, as perguntas se atropelavam. Com o objetivo de ´fazer uma única
explanação, Pedro achou por bem reunir a galera na piscina. Jantariam depois (o
jantar à luz de velas seria a próxima atração).
Sucedeu o
seguinte, colegas, falou o Bigode:
A Fifi
gosta muito duma tripa assada servida em um barzinho de Natal. Certo domingo
passamos por lá, eu sem beber, olha só, Bonitão. Depois de bom tempo, peço que
a Fifi passe o cartão, enquanto pego o carro, estacionado um pouco distante. A
Fifi vai me esperar na frente do barzinho. Ela sobe no carro na maior risadeira,
diz que se encontra com o Bonitão, que ele não a reconhece e me dar pormenores
do encontro. Começamos a rir e, como estávamos programando esta reunião,
arquitetamos a presepada da morte dela.
Todo o
planejamento foi no sentido de o Bonitão botar na cabeça que algo sobrenatural
estaria acontecendo com ele. Daí que a Fifi não atende as ligações do Bonitão,
mas liga pra ele e fala num tal de Feitosa. Feitosa, Bonitão, é o principal
personagem de um romance que a Fifi está escrevendo. O título é “O Feitosa te
ligou?” Quando a Fifi encontra você acha por bem, então, falar isso, o que
muito nos ajudou.
Continuando.
Nesse meio tempo, uma detetive localiza o Bonitão e entrega o convite da festa.
O Bonitão me liga imediatamente e combinamos almoçar juntos. Então eu lhe conto
que vivia com a Fifi e dou detalhes de sua morte. Provo tudo com fotos,
inclusive com a da Fifi no caixão. Só que o caixão era preto e não dourado,
viu, seu mentiroso Birita?
Zona
geral pra cima do Birita, Bigode precisou de um “muito bem” para continuar:
Muito
bem, a segunda parte aconteceu aqui, por óbvio. A Nazaré, aquela moça linda
ali, organizou tudo e foi cúmplice na aparição da Fifi. Apenas ela e o rapaz da
sonoplastia participaram da representação. O cinegrafista também sabia. Bom, Fizemos
a salinha de aula com uma porta camuflada, cuja abertura dá num quartinho, por
onde a alma da Fifi saiu. Ficou igualmente ali o Burunga, o responsável pela
parafernália técnica da encenação.
Tudo
pronto, a Nazaré pede que as mães não levem os filhos menores para assistirem à
aula, visto que o assunto seria impróprio para a garotada. Temíamos, colegas,
que a correria causada pelo aparecimento da Fifi viesse a machucá-los. Além
disso, a cuidadosa Nazaré advertiu os seguranças para não se importarem com
possíveis manifestações ruidosas advindas da casa. O temor era de que pensassem
ser a Fifi algum assaltante disfarçado e atirassem nela.
É isso,
gente. Aí chegam esses dois sacanas e armam aquela sacanagem. Não entendi
como...
Tomei-lhe
a palavra.
Engraçado,
né, Bigode? Vocês aprontam a safadeza e os sacanas somos nós. Apenas revidamos,
seu safado.
Vejam,
colegas. Tinha certeza de que o Bigode estava aprontando, pois a Fifi não
morrera. Seu extremado sentimento de pesar, Bigode, e a não crível tese do
sobrenatural a mim imposta me levavam à descrença.
Só se eu
não conhecesse, você, Bigode, dizia-me a mim. A certeza veio logo. A foto da
Fifi no caixão, pessoal, tinha uma data, no cantinho, pequenininha, quase
ilegível. Sabem qual era a data? Set/15. Como, se a Fifi morrera havia um ano,
em 14? Mas nada falei. Pelo contrário, dava-lhe corda e me fazia de amedrontado,
Bigode.
Agora à
tardinha, eu e o seu amigo, o Dr. Berilo, ríamos de suas traquinagens, Bigode,
então disse ao doutor que você ia aprontar, já que a Fifi estava viva. Contei-lhe
tudo. Nisso, o doutor se lembrou que, hoje pela amanhã, tinha visto, da varanda
da casa dele, a Nazaré descer de um carro com belo vestido de noiva nos braços.
Não é vestido de noiva. É a vestimenta da alma da Fifi, doutor, disse a ele.
É
verdade. Bigode vai aprontar, sim, Tião. Mas em que momento a Fifi vai
aparecer? No jantar, no show humorístico, no do cantor?
Em nenhum
momento desses, Dr. Berilo, argumentei, ao me lembrar de dois detalhes. Estávamos
na salinha de aula, eu, você, Bigode, e a Nazaré, quando um barulhinho de voz ecoou
no teto da sala, dois segundos, sei lá. O outro detalhe. Você não me mostrou a
prova. Alegou, Bigode, que perderia o encanto. Como me mostrar, seu merdinha,
se não havia prova? Daí que a não prova e o som do ambiente provavam-me que a
Fifi ia aparecer na aula.
Narrei os
detalhes, Bigode, então o seu vizinho - amigo e genial Dr. Berilo - deu
hilariante gargalhada, matou o assunto no peito e fez uma jogada de mestre:
Você vai
morrer, Tião.
Quê? Como
assim, Dr. Berilo?
A Fifi deve
“acontecer” na sala de aula, quando você falar o nome dela. Correria e tudo
mais, você desmaia e morre do coração.
Dito
isso, planejamos as minúcias da morte e pronto.
Agora,
não contávamos com certas calças molhadas nem com o catingão.
Algazarra,
assobios, zoação, estirei a mão:
Sabe,
amigos, a aula que não houve nos deu esta abençoada lição:
As
verdadeiras amizades não morrem.
A banal
sentença mexeu com a galera. Ficamos uns três minutos ouvindo tão somente o
aplauso do mar. Até que a emocionada Fifi gaguejou:
Vamos
jantar, turma.
Novembro/15, tempos de escassez das amizades verdadeiras,
TC
TC
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