HISTÓRICO BARRACO
Hoje, 21 do 7,
faz 69 dias que não apresento nada aqui. Concentrado na Copa do Mundo (Viva a
Copa), deixei o tempo passar. Porém, mal terminou a Copa, pensei em redigir um
texto esculachando o goleiro francês por ter feito aquela lambança no segundo
gol da Croácia, jogo final da Copa (ia ganhar um Bolão, gente, 900 paus, porquanto ter apostado na
França ganhando de 4 a 1).
“Esse número 1
da França é fuleiro, nojento e babão da Kolinda, a presidente da Croácia”,
gritei, dando um murro na mesa, derramando cerveja pra todo canto. Pra que
falei isso, gente! Gritei e logo surgiu na minha cara um dedão com o número 3
desenhado na unha. O tal de maior-de-todos esticou-se num gesto obsceno, berrou
um vtnc e jurou vingança: “Vais pagar pelo desaforo, TC. Tu é quem é fuleiro,
idiota”, esbravejou e sumiu.
Tô vendo
coisa. É a bebida, pensei.
Pois bem,
os
dias passam, dou o surreal episódio por esquecido, até que sexta-feira, dia 13,
ligo o notebook a fim de escrever algo sobre o Dia do Amigo, a ser comemorado
dali a uma semana, dia 20 do 7. O Dia do Amigo, sabem os senhores, é comemorado
nessa data em alusão à chegado do Amstrong, Aldrin e Collins à lua. Por sinal,
o trio foi recepcionado por mim.
Sabiam disso
também, senhores?
Pois! Abraçaram-me
e o azoreta do Neil logo brincou, entregando-me uma cápsula de aguardente: “E
aí, Aluado, como estão as coisas?”
Pois bem de
novo. Abro o word e começo a redigir a prosa do amigo. Mas, quando vou teclar a
data “20 do 7”, os dedos travam. Encarquilham-se, gente. Não saía nada. Como se
os algarismos estivessem resfriados, respirando no ventre da imaginação,
fugindo do artificial sol do computador. Nisso, escuto o risinho irônico e a
piada: “Escreve algarismos, TC. Escreve. Escreve, imbecil”. Era o sacana do 3
sacaneando comigo.
A ficha caia,
a vingança do peste do 3 se consumava. O 3 era amigo do algarismo 1 do goleiro
da França e do restante da numerada.
Foi essa a
primeira manifestação de corporativismo da história.
Disso também sabiam
os senhores?
Pois! Ocorre que
quem tem rabo preso deve botar a barba de molho na bacia de certos assuntos. E eles,
os algarismos, tinham telhados de vidro. Vou desmascará-los. Postarei aquele
barraco, matutei.
Mas havia um
problema. Para expor o barraco, eu precisava digitar os danadinhos de 0 a 9. Não
podia falar da baixaria do 5, por exemplo, sem o 5 digitar, concordam? Mas como
digitá-lo se os dedos travavam na hora? Matutei, matutei e pimba.
Chamei minha
neta Bia (só tenho uma neta, gente, por isso não botei vírgula), meu amigo Ben e
expus a situação. Ben, pessoal, é como chamamos o bem-te-vi que vive mexendo
nas coisas daqui de casa. Ben ama a Bia. Fica um tempão se sacudindo pra ela. Pula
nas perninhas dela e canta: Ben, ben, ben. Te-vi, te-vi, te-vi.
Pois bem
novamente. Digitei o barraco, inclusive o texto agora editado, e deixei os
espaços para pôr os algarismos. Então. Desde sábado, que hoje, 21 do 7, faz
oito dias, que é este o nosso ritual: acocoro-me com o notebook nas pernas, e a
Bia e o Ben ficam preenchendo os espaços com algarismos por mim indicados.
Deu certo, já
que a Bia adora dizer que vai fazer um aninho com o dedinho indicador e o Ben ama
bicar objetos.
Foi assim, gente.
Agora vou jogar
pro mundo o barraco da numerada.
Leiam.
Desconheço o
ano do evento, mas sei que se tratava de um seminário sobre aritmética. Árabes,
romanos e afins reunidos, numerada na maior festa, e eis que, cheios de goró, o
5 e o 7 começam a sacudir os traçados para a amante do 2, a curvilínea “Duas”.
A propósito, apenas dois algarismos, o 2 e o 1, têm amantes. A amante do 2, já
falei, é a curvilínea “Duas”, e a concubina do 1 é a esbelta “Uma”. D. Uma,
digo logo, gosta de dar uma puladinha de cerca. Mora com o 1, mas mantém um
caso com o quase vizinho, o trepidante 3. É por isso que aqui, acolá a gente
encontra a expressão “três em uma?”
Então, quando
o 2 pressentiu o cheiro de queimado armou o primeiro barraco da história. Embriagadíssimo,
foi tirar satisfação com o 5 e o 7. Tomou logo o tracinho que o 7 carregava
entre as pernas e pegue porrada em quem encontrava pela frente. O 4 armou-se
com quatro pedras nas mãos e o 3 com uma baladeira. De nada adiantou: apanharam
feitos mulher de malandro. O 0, coitado, tirou o dele da reta, recolheu-se a
sua insignificância e se escondeu atrás de uma das retas de Euclides. O 2
arremessou a outra reta do Euclides no 8. A reta pegou embalo, tirou fino no
delta do bundão 6, atingiu de raspão o cabeçudo do 9 e pegou em cheio o teorema
de Pitágoras. Tão em cheio que espalhou hipotenusa pelo resto do mundo. Até
hoje a reta de seu Euclides viaja. Está procurando o infinito.
Falar em
infinito e retas do Euclides é bom passar a limpo aquele mito de que duas retas
paralelas vão se encontrar no infinito. Isso foi o 7 (mentiroso nato) quem
espalhou mundo a fora. Elas se encontram do infinito pra dentro, essa é a
verdade. A mentira veio à tona pelos estudos do Leonel, irmão do Euclides. Leonel
provou por A e mais B que duas retas paralelas passam do infinito e vão se encontrar
no quinto dos infernos, num lugarejo chamado Curva do Vento, precisamente onde o Judas perdeu as botas.
Nem vou
perguntar se os senhores sabiam disso.
As botas...
Ah, deixa pra lá.
Bom, mas quem
sofreu mesmo foi o nosso amigo 5. Levou tremenda surra, foi chamado de cachorro
e perdeu o status de PI. Antes do barraco, gente, o PI era exato 3,15. A
monumental surra o despedaçou de tal forma que o moleque perdeu a posição para
o 4 e cedeu lugar à incerteza. Hoje o PI é conhecido por 3,14 e tome
algarismos.
Certa feita, D.
Uma, que, como falei, vivia maritalmente com o 1, o qual dela já vinha
desconfiando, mandou uma mensagem secreta para o 3. Pedia-lhe um encontro no
local de conversão das linhas do trem. O 3 captou a mensagem e correu pra lá.
Lá, após estimulantes e primitivos equacionamentos, D. Uma deu a seguinte
orientação ao amante.
Escuta, 3, adorei
reencontrá-lo, mas vamos redobrar os cuidados, pois o 1 anda meio esquisitão. Quando
a coisa esfriar, você pode vir a minha tabuada, certo? Aqui entre essas linhas
estaremos seguros, mas...
A partir do encontro de D. Uma com o 3, entre
as linhas do trem, começa a se falar de entrelinhas como algo dissimulado,
subentendido, oculto. Sobretudo na escrita.
Os senhores
sabiam disso também?
Outra coisinha
que começou ali foi a jocosa e pérfida expressão “pular a cerca”. Tudo porque
para chegar às linhas do trem, D. Uma e o 3 precisavam pular a cerca de arame
protetora da conversão férrea.
Sabiam também
disso os senhores?
É isso.
Engraçado é
que quando entro no blogue a fim de fazer a postagem, a Bia chega se
arrastando, com o Bem no cocuruto, e ficam, os dois, me observando. Certamente queriam
aparecer como coautores do texto. Do Ben, avoado que só ele, não arrisco previsão. Mas da Bia, bisbilhoteira toda, não tenho dúvida de que leva jeito pra essas amalucadas coisas da literatura.
Então tá.
Julho/18,
TC, Bia e Ben
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